Preparativos para um casamento

Para uma mulher os preparativos para ir a uma festa de casamento são semelhantes aos preparativos para uma peleja.

As mulheres correm aos salões de cabelereiro e uma grande transformação é feita, cabelos, olhos, bocas tomam novas cores e até peitos ganham novas dimensões.Vestidos longos são tirados dos armários juntamente com todo um conto de fadas, castelos, principes e festas, tudo isso em meio a fumaça e a correria do século XXI.

A sortuda classe masculina, que durante séculos vem se mantendo afastada de grandes produções como essa, apenas senta-se em frente a televisão já com o básico terno e grava e vê passar apressadamente de um lado para o outro as peças de um quebra-cabeça que dará novo visual a mesma mulher.

Vez por outra um ou outro questionamento é feito sempre em busca de uma resposta posítiva.

? Viu meu vestido novo? ­? pergunta.
– Claro.
– O que acho? ? buscando a certeza de que a peça agora pendurada no mancebo era a essencia de toda a produção.
– Bonito. ? respondi, como se falasse de um carro de 3 anos atras.
– Você está falando sério ? ? pergunta como se tivesse visto até o ano do carro na minha resposta.
– Claro que estou. ? agora muito mais convincente como se fosse um grande estilista.

Mais três ou quatro aberturas no armário e pronto, barulhos de cabides se acotovelando, como se quisessem sair de dentro do guarda-roupa para aproveitar o passeio da noite e lá está a grande dama do baile, em seu vestido negro novíssimo pronta para o combate.

– Vamos? ? diz decidida para o seu escudeiro armado com o controle remoto da TV e olhar perdido na programação.
– Pois não madame. ? ironiza.

O escudeiro dá aquela leve ajeitada na gravata, pega a chave do carro e escolta a grande dama para os seus minutos de glória.

Ao final da noite tudo volta a ser abóbora, a maquiagem se vai junto com as lágrimas, as meias se rasgam e a dor nos pés se faz presente. Mais uma batalha vencida.

O vestido volta para o armário até o próximo embate e o que sobrou da maquiagem se vai junto com lenços umidecidos.

Mulheres, essa magia é o que faz serem tão maravilhosas.

Maldita fruteira

Maldita fruteira

  (Tela de Aldemir Martins 1995) 

Minha mulher pegou um cupom na mesa da sala e se dirigiu ao quarto. Nessa mesa reside uma fruteira enorme de fino cristal, cheia de frutas de vidro e lascas de madeira aromatizadas ornamentando um espaço que, em minha opinião poderia ser ocupado com algo muito melhor.

Alias sendo mais realista, fino cristal coisa nenhuma, vidro mesmo e por falar nisso pra que serve uma fruteira na sala? Segundo o dicionário uma fruteira é um recipiente para guardar frutas. Bingo!!!! A descrição bate com o dicionário, realmente é uma fruteira. Embora as frutas sejam de vidro, sem dúvida nenhuma é uma fruteira.

Já insisti várias vezes com a dama que aqui mora sobre a utilidade de tal utensílio aqui em casa e ainda por cima na mesa da sala, onde já se viu. No meu entender um dispositivo para guardar frutas deve ficar onde as frutas estão, ou seja, na cozinha. No entanto, como tenho fama de ser azedo como vinagre, meus comentários não passaram de chateação e a queixa foi registrada a lápis no livro de reclamações aqui da casa, com certeza foi arquivada.

Antes que seja condenado como um sujeito desumano que não se preocupa com o bem estar de frutas e legumes, e ainda por cima tenta retirar-lhes o teto, ressalto que lugar de fruta é na geladeira. Este sim é um ambiente adequado. Na geladeira as cores são mantidas, o aroma permanece por mais tempo, e o que dizer de saborear uma maçã bem geladinha, garanto que não há prazer igual para os apreciadores da espécie.

Mas na sala não dá, já sei. Vou propor um acordo, colocarei a fruteira e as frutas dentro da geladeira, assim acabam-se os problemas e eu ganho todo aquele espaço maravilhoso sobre a mesa para itens, digamos, mais nobres como uma estátua, um lindo vaso, a pasta de trabalho, chaves e etc…

As frutas de vidro e lascas aromáticas que me desculpem, mas assim como a fruteira terão de procurar um local onde melhor se encaixem.

Individualidade e Indivisibilidade

Individualidade e Indivisibilidade

Poucas paisagens eram tão agradáveis pra mim quanto olhar o por do sol de verão do último andar do prédio novo da PUC de São Paulo.

Por uma feliz coincidência do destino existem poucos prédios na frente e por um acaso mais feliz ainda, é possível se ver ao longe a Zona Oeste de São Paulo e um pedaço da Zona Norte.

Conforme a noite chegava pouco a pouco, as luzes da cidade começavam a se acender, e é era possível ver a distância, aquilo que o dia tornava indiferente. Pensava comigo, em cada luz daquela existem uma ou mais pessoas, com idéias tão exclusivas quanto as minhas, com um olhar tão diferenciado quanto o meu sobre as coisas do mundo.

Em cada uma daquelas luzes existem pessoas, com as idéias mais iluminadas e sinistras do mundo, em cada uma daquelas luzes existem um ou mais mundos com alegrias, tristezas, medos, sonhos e esperanças. E até mesmo do alto de algum outro prédio na Zona Oeste, esteja alguém venho ao longe a estranha forma do chamado prédio novo da PUC e pensando da mesma forma que eu.

Essa individualidade é o que torna essa espécie humana tão fascinante, bilhões de seres humanos, reagindo a trilhões de impressões todos os dias, todos os instantes, encaixadas em moldes ora largos, ora justos demais que regulam atividades, relacionamentos e linhas de conduta.

Existe uma tendência muito grande a comparar pessoas com grãos de areia, acho matéria muito inerte, não gosto da comparação. Prefiro compará-las a representação da água em estado de ebulição, onde nos desenhos de escola víamos átomos ensandecidos, colidindo com a parede de recipientes imagináveis numa agitação frenética. As pessoas são assim, experimente tirar a forma e o padrão e veremos como essas idéias perdem o controle. Tiramos o recipiente imaginário, os átomos se dispersariam, nós também.

Palavras negativas, Pensamentos negativos, Vidas negativas.

“O Cara” é o pai de toda a conspiração e provavelmente o destino da vida deles está em suas mãos.

É impressionante como falar mal das pessoas rende. Rende horas de papo, suposições, conspirações, conchavos.

Experimente o inverso, já fiz esse teste. Durou cinco minutos porque foi o tempo que a pessoa precisou pra dizer: “O Cara” é legal.

Mas como o que rende é falar mal, vamos falar mal sobre falar mal. Meter a boca na vida alheia ou no alheio é o ópio do povo, impressionante. Ta estressado no trabalho, nada como uma boa roda na hora do almoço para meter a boca em alguém. Vamos chamar esse alguém daqui pra frente de “O Cara”.

Começa sempre com um – você viu o que “O Cara” falou? OU ? você viu o que “O Cara” fez. Pronto, nesse ponto o interlocutor já conseguiu ganhar a atenção da platéia, é como se todo mundo já estivesse esperando a desgraça sair da boca do sujeito e preencher a carência de catástrofe dos demais.

Depois do evento narrado, vem sempre aquele com cara de conteúdo dizendo ? Ahhh, é por isso que…. – Ou então ? Eu sabia que isso ia acontecer quando.

Depois de todos chegarem às conclusões vem a consumação de que “O Cara” é o pai de toda a conspiração e que provavelmente o destino da vida deles está em suas mãos.

O próximo passo é começar a bolar planos para impedir que “O Cara” domine o mundo (diga-se de passagem ele nem sabe que está tentando dominar) e transforme todos eles em escravos zumbis. Aí, chega a hora de voltar a realidade e voltar ao convívio com ?O Cara?. Só que a essa hora estão todos tão cheios do “O Cara” que nem mesmo dá pra olhar pra ele, que dirá cumprimentá-lo, ajudá-lo ou etc…. Em um almoço “O Cara” foi, julgado e sentenciado ao exílio. E a situação que era apenas uma situação virou um outro fato.

Quantas vezes isso acontece por dia, quantas vezes, essas rodinhas negativas crucificam pessoas, que às vezes só estavam trabalhando, só estavam conversando, só estavam viajando, só estavam fazendo aquilo que deveriam fazer e ninguém mais tem a ver com isso.

Devemos ter cuidados antes de fazer julgamentos rápidos. Ou somente tentar falar negativamente de quem está presente para se defender.

– Grandes pessoas falam sobre idéias.
– Pessoas medíocres falam sobre coisas.
– Pessoas pequenas falam sobre pessoas.

Luzes na Estrada

Viajei muito com meus pais, principalmente quando tinha a idade na qual 30 km de distância era uma longa viagem e a sensação era de que iria conhecer uma outra galáxia. De certa forma naquela idade realmente eu estava descobrindo um mundo novo como toda criança.

O tempo passa e as distâncias ficam menores, o mundo fica incrivelmente menor depois que você passa mais de 10 horas abordo de um avião.

Daquela época, nos prelúdios da consciência que tenho agora, trago a imagem das luzes que despontavam com a chegada do noturno, luzes distantes no meio do nada, no meio do mato. Aquela luzinha que você vê da estrada.

E ficava imaginando como ainda fico, como será a vida daquelas pessoas, o que elas comem, como elas chegam lá, o que fazem?

Como será a realidade daquelas pessoas? Realidade, talvez seja a palavra mais ardilosa que existe. Assim como a maior façanha do diabo foi provar para todo mundo que ele nunca existiu, a da realidade talvez seja a de forçamos a acreditar que o que vemos é o real e o normal.

Pare e veja a sua vida, se você lê esse texto, você provavelmente estará utilizando a internet, milhões de pessoas conectadas por meio de fios umas as outras. Agora pare, e volte naquela casinha no meio do nada. Será que podemos dizer que é a mesma realidade? Talvez quem more lá nunca tenha visto um computador, e não tenha a mais pálida idéia do que seja internet. Alias talvez ele não tenha a mais pálida idéia de muitas coisas que nem damos mais importâncias por terem se tornado banalidades na nossa vida. Como um chuveiro, por exemplo ou uma fruteira na sala de jantar.

Mas a realidade segundo a própria realidade, é aquilo que realmente existe, é o fato, é o real. Só que para sabermos se algo é real, precisamos conhecê-lo ou simplesmente aceitar sua existência. Dessa forma lhes apresento outro paradoxo.

Se aquilo que é real pertence somente ao que conhecemos, então acabamos de popular o mundo com bilhões de coadjuvantes que apenas passam pela sua vida. Como alguém que atravessa a rua na sua frente.

Se olharmos do ponto de vista do aceitar, vamos nos perder em um emaranhado de subjetividades pessoais, onde mitologia e sonho podem tomar forma no suposto mundo real.
De qualquer forma a realidade é algo tão frágil que não sobrevive a um porque. Comece a perguntar o porque das coisas e verá que mundo novo e maravilhoso existe a sua volta. Ou não…..